23 de maio de 2011

Michelangelo Buonarrotti - o homem

"Eu avanço sozinho por caminhos ainda não trilhados."



Corajoso ou covarde, desconfiado ou generoso, rebelde ou dócil, intolerante ou humilde, racional ou supersticioso, atormentado sempre, apaixonado sempre, solitário sempre, Michelangelo escapa a cinco séculos de esforços por catalogá-lo, foge a todos os diagnósticos simplistas - neurastênico, masoquista, desajustado social, hipocondríaco, homossexual, megalomaníaco, visionário - evade-se de quaisquer rótulos, menos de um: gênio.
Raras vezes a designação de gênio terá sido tão apropriada para descrever a potência de uma inesgotável capacidade criadora e a variedade de formas pelas quais ela se exprimiu: escultor insuperável numa época em que Donatello e Verrocchio elevavam a escultura italiana a um nível só antes atingido pelos gregos; pintor que revolucionou a concepção da pintura mural com os afrescos da Capela Sistina, numa época em que Masaccio, Rafaello, Leonardo da Vinci, Paolo Uccello, Botticelli, Ghirlandaio e tantos outros abriam à Europa novos horizontes expressivos; poeta maior no país que viu nascer o soneto - um multiforme e assombroso engenho animava todas as suas manifestações. Sua pintura, suas estátuas, sua poesia, sua correspondência, sua arquitetura, situam-no definitivamente, ao lado do extraordinário Leonardo da Vinci, como o maior nome do Renascimento.
O traço que o distingue imediatamente e o acompanha ao longo de sua vida feita de trabalho e dor é a paixão. Foi com uma intensidade desmesurada e total que se entregou à arte, ao amor, ao próprio desespero. Assim, justamente esse máximo expoente do Renascimento clássico da Itália é no tempo um dos primeiros temperamentos românticos por excelência. Sua personalidade arrebatada comportava uma tristeza inextirpável, um pessimismo e uma melancolia presentes em toda a sua obra e em sua visão do mundo.
Como o albatroz a que Baudelaire comparou o poeta entre os mortais - " suas asas imensas o impedem de avançar" -, Michelangelo foi necessariamente um solitário. Como Beethoven viveria isolado pela incompreensão de seus contemporâneos e pela surdez crescente, como Bach passaria despercebido em toda a sua sublime grandeza entre os alemães do século XVII, Michelangelo foi combatido sem tréguas por todos os que invejavam a grandeza sobre-humana de sua genialidade.

Fonte: Gênios da Pintura Editora Abril Cultural.